20 dezembro 2006

Hoje não sou...



Hoje não sou eu que vejo o mundo como esfera de inomináveis fenómenos de criação.

Hoje não sou eu que transporto as palavras comigo como se fossem peças do meu querer.

Hoje não sou eu que toco o vento na minha pele como se a pele do vento fosse feita de mim.

Hoje não sou eu que olho mas o olhar que dista de mim para fora num perímetro circular espiralado, abrangente de toda a ubiquidade do mundo, em todos os espaços e tempos ao mesmo tempo.

Hoje não tenho cor ou brilho específico e tudo se dissolve e dilui como um mar de possibilidades infinitas prontas a desfalecer no despertar da aurora.

Hoje não sinto, nem sou, nem olho, nem vejo, nem oiço, mas também não pereço mais do que permanecer uma finíssima névoa para lá das possibilidades de um deus qualquer.

Hoje, o que sou, é um estado à flor da pele, que pode ser tudo e dissolver-se no nada, sem que daí venha mal ao mundo, ou cataclismo de maior, que não o seu decorrer quotidiano em volta do sol…

13 dezembro 2006

Para além do esquecimento…


Todas as pausas
Todos os momentos
Todos os instantes perpetrados no tempo…
Todas as palavras
Todos os gestos

Olhares de uma coisa única… o esquecimento…
Todos os dias, minutos e horas
Todos os sons sussurrados ao vento, sob o luar lívido de
Todas as noites
Todos os sois de todos os tempos
Todas as impressões crepusculares

São prenúncios de esquecimento...

Todas as marcas com que nascemos
Todos os sonhos e todas as vontades
Todas as pedras desta calçada
Todas as mãos de terra lavradas
Todos os gritos que parimos mudos

São repetições de esquecimento…

O que fica impresso na pele da memória para além do esquecimento?


… O Alfa da minha percepção…
… O Ómega no íntimo universal…
… O princípio de todas as coisas…
… O fim de todos os mistérios…
… Os frutos da Árvore da Vida…
… Ou da Árvore do Conhecimento?
Qual o sentido do que está para além do esquecimento?

As coisas únicas, apenas únicas, num instante no tempo, e jamais repetidas
Os gestos e as palavras da tua e da minha vontade…

Num olhar anónimo que reflecte os teus olhos
Num sorriso apanhado na rua que me toca com os teus lábios
Como se toda a verdade fosse uma repetição dos nossos actos
E o universo não reflectisse mais do que a nossa existência…

Qual o sentido do que está para além do esquecimento?
Não será apenas a marca das tuas nas minhas mãos?